Quercus considera a situação preocupante e
defende que Portugal deve alterar o paradigma de produção agrícola intensiva,
baseada no regadio
Segundo
informação mais recente sobre a seca, divulgada ontem ao fim do dia pelo
Instituto Português do Mar e da Atmosfera, I. P. (IPMA, I. P.), no final do mês
de agosto mantinha-se a situação de seca meteorológica em todo o território de
Portugal Continental. Apesar de se ter verificado um desagravamento da área do
território em seca severa e extrema, 58,9% do território estava a 31 de agosto
em seca severa, 37,8% em seca moderada, 2,6% em seca fraca e 0,7% em seca
extrema.
Perante as
dificuldades que o país já atravessa na situação atual, em atividades muito
dependentes da quantidade de água no solo, tais como a agricultura, e com um
mês de setembro que continua seco e onde ainda não existe previsão de chuva, a
Quercus considera que a situação se mantém preocupante e que o Governo deve manter
e executar com rigor o Plano de Contingência para a Seca atualmente em vigor.
A seca e as
alterações climáticas.
Para a
Quercus, é importante não desvalorizar a gravidade da situação que o país
atravessa, sendo urgente tomar medidas, não só ao nível dos efeitos que já se
fazem sentir, mas também da adaptação a um novo cenário que se prevê ser, cada
vez mais, a nova normalidade. Com efeito, as regiões mediterrânicas, sobretudo
a Península Ibérica, têm vindo a sofrer um processo de desertificação crescente,
associado à escassez de recursos hídricos e, em Portugal, o Alentejo e o
Algarve são das regiões mais afetadas.
De acordo
com o Sistema Nacional de Informação de Recursos Hídricos (SNIRH), em Agosto
todas as bacias hidrográficas do território continental viram diminuir a
quantidade de água armazenada face ao mês anterior. Do total de 60 albufeiras
monitorizadas, 21 apresentavam disponibilidades inferiores a 40%.
As
alterações climáticas contribuem, sem dúvida, para o agudizar o problema, na
medida em que assistimos já a uma diminuição da precipitação anual, um
indicador de que os períodos de seca serão muito provavelmente mais frequentes
no futuro e a sua incidência mais grave no sul do país, embora também o possa
ser no interior.
Segundo um
estudo da universidade britânica Newcastle, a Península Ibérica pode vir a
enfrentar períodos de seca iguais ou superiores a 10 anos até 2100. Já a
Protejo – Movimento pelo Tejo afirmou recentemente que, derivado de uma
combinação de fatores como as alterações climáticas, os transvases não
controlados e a poluição, o Tejo corre o risco de secar completamente.
Necessário
travar a agricultura intensiva de regadio
A agricultura é o setor com maior peso no
volume de água consumido a nível nacional, representando cerca de 75%. Contudo,
este peso, apesar de naturalmente mais elevado em relação a outros setores de
atividade, poderia ser menor se não fosse a excessiva aposta nas culturas
agrícolas intensivas de regadio, assentes no uso de pesticidas que empobrecem
os solos e contaminam os aquíferos.
Com efeito, as opções agrícolas que têm vindo
a ser tomadas nos últimos anos têm privilegiado em demasia as culturas
intensivas de regadio, que apresentam consumos consideráveis de água, em prol
das culturas agrícolas de sequeiro. Esta opção é muito questionável para o
futuro quando a grande maioria dos cenários aponta para períodos de seca cada
vez mais acentuados no nosso país.
O caso do olival intensivo é um exemplo
particularmente preocupante a este nível, uma vez que uma cultura tradicional
como é o olival de sequeiro (sem necessidade de irrigação), bem adaptado às
nossas condições edafo-climáticas e com um valor acrescentado reconhecido
internacionalmente, tem vindo, de uma forma cega e com o apoio do Estado, a ser
substituído por culturas intensivas de olival, de variedades não nacionais, de
regadio e com consumos acrescidos de fertilizantes e pesticidas de síntese.
Para além disso, as elevadas necessidades de rega decorrentes do modelo
intensivo praticado têm impulsionado um investimento desproporcional em grandes
infra-estruturas sobredimensionadas, como é o caso do Alqueva, ao invés de se
apostar nos pequenos armazenamentos.
Assim, a
Quercus considera que Portugal tem de resolver este problema na raiz, apostando
na agricultura menos dependente de grandes quantidades de água e privilegiando
variedades autóctones, mais adaptadas ao nosso clima e mais resistentes aos
futuros cenários de seca, que vão ser por certo, infelizmente cada vez mais
graves e frequentes.
Será
fundamental, paralelamente, que o Governo Português, no âmbito da próxima
revisão da Política Agrícola Comum, encare este problema de frente, ao
contrário do anterior Executivo, e não ceda aos grandes grupos de interesse que
dominam o sector da agricultura intensiva de regadio, negociando com Bruxelas
um reforço de apoios para uma agricultura mais sustentável, menos dependente de
água e melhor preparada para o futuro do país.
A Direcção
Nacional da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza